quinta-feira, 12 de dezembro de 2019

A fofoca da Joana

Vou fazer fofoca, porque minha vida tá tão complicada que às vezes é mais fácil refletir sobre a vida alheia.

Voltando pra casa no 239, finalmente consegui um lugar sentada, já no Méier. Uma mulher que também estava em pé desde que entrei no ônibus, sentou do meu lado. Vou chamá-la de Joana. Não só pra preservar sua identidade, mas porque realmente não sei o nome dela. Ali na altura do Guanabara do Eng. De Dentro entra uma vizinha da Joana no ônibus. Nós estávamos sentadas no banco alto (porque eu, com meus 1,5x m, nunca perco essa oportunidade). A vizinha sentou no banco da frente e começaram a conversar. Eu tento não prestar atenção. Mas é mais forte que eu, ainda mais quando estão falando alto.
Não sei como Joana chegou no assunto de que a mãe dela ficava triste por não ter tido netos de nenhum dos cinco filhos. Ela disse que os irmãos homens nunca quiseram, mas que ela tinha tentado adotar.
Ela fez tudo certinho, entrou com a documentação, conhecia o abrigo, conheceu o menino. O menino gostou dela, ela dele. Só esperando a burocracia.
Mas quando a assistente social foi fazer uma visita na casa da Joana o negócio degringolou.
"Você mora no morro né? Não tem condições de criar uma criança aqui."
Nessa hora eu controlei todos os reflexos do meu corpo pra não soltar aquele "Ahhhh vá!"
Pesou no coração demais.
Joana disse que se controlou pra não dizer poucas e boas. Que pra uma juiza aí que tinha dinheiro eles deram criança e a mulher espancou a menina. Ela tinha visto na tv.
Conforme Joana foi falando me parecia cada vez menos só uma mulher que falava alto e pra caramba dentro do ônibus. A casca alto astral e extravagante da Joana foi dando lugar a um jeito de fruta, dessas doces mas não muito, tipo kiwi.
Ela disse que sabia que morro era complicado, que o menino ia ver bandido passando. Mas educando, ela acreditava que daria certo. Ela não tinha dinheiro, mas tinha muito amor pra dar. E o pouco de coisa que tinha seria dele. Dava pra ele crescer e viver direitinho. E ela ia botar ele na escola, porque estudo é tudo. Tem menino que anda com os bandidos, mas tem tanto menino de bem, que faz até faculdade. E eles tinham se gostado tanto, sabe?
A Joana parou de assistir a nova novela da 21h porque o menino adotado pela personagem da Taís Araújo era muito parecido com o menino dela. Ela disse que nessa novela a Taís representa ela, só que a Taís conseguiu e ela não. Então como ela só fazia chorar quando via os dois na tela, resolveu não assistir mais. Mas ficava feliz com a história. Bobeira isso de ter que ser casada e rica. Criança precisa de algumas condições sim, mas precisa muito de amor.
Quando Joana conheceu seu menino ele tinha de 6 pra 7 anos. Hoje ele tem 11. Ainda não foi adotado, já fazem cinco anos.
Até hoje Joana leva presente de Natal e alguma outra coisinha de vez em quando.
Esse ano ela deve ir lá de novo.